Starley Bonfim Silva, a arte de alguma forma sempre esteve presente na infância do artista, sempre fascinado por desenhos animados, quadrinhos, animações 3D, sempre prestando atenção nos efeitos computadorizados de alguns filmes. Consequentemente o que absorvia era reproduzido nos cadernos, folhas A4, cartazes e em paralelo a alguns elogios da infância e pré-adolescência (“muito bom”, “Parabéns continue assim” “Você é um artista hein” e outras coisas do tipo) e uma necessidade de canalizar as energias em algo foram os combustíveis para uma produção constante durante boa parte de sua juventude.
De bairro periférico (Vila Nova de Colares – Serra ES/Brasil) e imerso em problemáticas sociais, familiares e emocionais, fez do ato de desenhar o seu universo particular, sua válvula de escape onde os problemas pareciam pequenos perto da sua concentração e os lápis de cores. O primeiro contato com o Graffiti veio aos 16 anos (2006) em um show do rapper Thaíde em Jacaraípe – Serra, onde encontrou os Artistas da “velha escola” Fredone Fone e Alecs Power realizando intervenções, a partir deste dia sua vida estava prestes a ganhar um novo rumo. Participou de uma oficina de técnicas de Graffiti, porém não concluiu, nem mesmo chegando a parte prática mas, sempre acompanhando a cultura HIP-HOP e realizando pesquisas na internet. Em virtude de dificuldades financeiras, correria cotidiana, trabalho, entre outros fatores a Arte ficou em segundo plano e somente aos 20 de idade (2010) se lançou de cabeça na Arte de Rua, fazendo alguns poucos tag’s e muitos personagens devido a sua forte ligação com o desenho, geralmente acompanhado de frases e reflexões pela vontade de expressar o que pensava.
Neste mesmo ano fundou a F.G Crew (Força Graffitacional), que atualmente conta com cinco integrantes (Starley – Keka – Liam – Moris – Dentin) e de lá pra cá busca desenvolver trabalhos que dialoguem com as pessoas que transitam pelo espaço urbano e comunitário, com obras que remetem a questões sociais ou que estimule o prazer em viver em coletividade, fazendo o bem, valorizando a riqueza da simplicidade, propondo e reforçando ideais existentes. Após seis meses de Graffiti se fascinou com o Realismo tendo como referência os Artistas AQI Luciano e Alex Fagundes, posteriormente o artista espanhol Belin e a Maclaim Crew. Com tantas boas referências em pouco tempo fez deste estilo também a sua marca registrada pelos muros da cidade, com uma evolução meteórica a cada trabalho, com uma preocupação técnica fora do comum. Atualmente o realismo é uma ferramenta essencial para suas proposições, reflexões e poética em seus trabalhos, mesclando elementos vetores e alguns simbolismos, fazendo do seu trabalho um instrumento de ressocialização, representação de universo e libertação interna.
Veja nossa entrevista com Starley :
1 – Como surgiu seu interesse pela arte ?
Como toda criança que se preze meu interesse surgiu através dos desenhos animados que eu via na TV, adorava ficar reproduzindo os personagens, alguns eu fazia de memória, outros eu reproduzia de uma figurinha de chiclete, posters de filmes (sentava na frente da locadora para desenhar kkk), animações 3D me fascinavam, lembro a primeira vez que assisti Vida de Inseto e Toy Story, fiquei pirado (risos), além de ter um tio que desenhava muito, o meu Tio Eduardo, onde vi muitos carros e nus artísticos feitos por ele, nessa época eu tinha 6 anos de idade.
2 – O que te influenciou a ser um Artista Visual (grafiteiro) ?
Na real eu não tive uma influência direta a ser um Artista Visual ou grafiteiro, partindo do conceito e entendimento que se tem hoje, sempre gostei de desenhar, a principio eu via o spray como uma nova ferramenta. Sabe quando você ganha uma caixa de lápis de cor nova ? foi tipo isso, eu não tinha noção do poder de transformação e impacto da arte, não sabia nada a respeito do conceito e origem do Graffiti quando vi pela primeira vez, só queria desenhar com a lata. Quando percebi o poder de comunicação que o Graffiti proporcionava e isso aos 20 anos, (sendo que esse primeiro contato foi com 16) que eu comecei a levar mais a sério, sempre fui muito questionador e queria dialogar a respeito de assuntos que meus pais e a sociedade em geral julgavam serem assuntos que exigissem um certo grau de maturidade e isso me incomodava, dos 16 aos 20 tive um bom tempo de reflexão e estudo, ao perceber que intervir nas ruas era uma forma de mostrar o que penso, me joguei de cabeça, nessa época (2010) eu estava cursando História na Federal do Espírito Santo, então minha mente estava fervendo de reflexões e a sensibilidade com questões sociais estava ainda mais aflorado, pois descobri algumas mentiras ensinadas na escola.
4 – Como foi o inicio e quais às barreiras que você enfrentou ?
O inicio foi simples, desenhava muito no papel logo pensei: -“vou comprar umas latas e fazer!”, na época eu trabalhava com carga e descarga de caminhões (ôôôh trabalhosinho sofrido, haja coluna kkk), comprei umas latas de spray em um material de construção, que parecia veneno de matar barata e fui para as ruas me expressar com palavras, desenhos e uma pitada de ingenuidade. Minha mãe não foi totalmente a favor no inicio, mas como sempre trabalhei, desde os 8 anos de idade eu tinha moral com a “véia”, ajudar a botar dinheiro dentro de casa me emancipou em várias questões na infância e adolescência, aos 20 anos então não seria minha mãe que ia me freiar (risos). Mas como é de praste, as dificuldades financeiras foram as principais barreiras no inicio, dificuldades existentes até hoje porém a dinâmica de organização financeira esta mais madura. Logo comecei a dar aula como voluntário em Projetos sociais e com algumas sobras de materiais fomentava minha produção na rua.
5 – Quando consolidou seu estilo ?
Logo de inicio tive contato com o realismo, imergi nessa linguagem após 6 meses de pintura constante na rua, não sei dizer quando consolidei, pois não gosto de pensar em solidez em algo que esta em constante mutação, embora faça o realismo e tenho motivos até ideológicos para isso, gosto de me permitir, deixar fluir, estar aberto para novas experiências e influências que agreguem ou até mesmo desconstrua minhas proposições para uma reconstrução que se sustente mas, com leveza, não com rigidez, rigidez tende ao radicalismo. Atualmente não tenho uma preocupação estilística, do tipo a ser reconhecido pelo traço, cor e estética…minha preocupação é com o que estou transmitindo e como estou transmitindo, como isso afeta o imaginário e o psicológico social.
6 – De onde buscou referências para seu estilo ?
No realismo dentro do Graffiti em especial: AQI Luciano, Alex Fagundes, Belin e Maclaim Crew, fora da Arte Urbana o Caravaggio me impressiona, embora eu não tenha essa relação do Alto Contraste e claro-escuro destacado nas minhas obras mas, atualmente as referências são diversas a internet nos deixa em choque diariamente, quando abro o Instagram e vejo artistas que nunca acompanhei com trabalhos fantásticos que me inspiram a propor novas coisas, dentro do campo visual e ideológico.
7 – O que te inspira nas suas criações ?
Música é algo que me inspira muito, pois trabalha com palavras, ritmos que mexem com seu ânimo, puts…uma música pode mudar o seu dia. Ver obras de outros artistas me inspira, filmes com determinadas histórias me inspira, ver o empenho, superação e dedicação dos integrantes da minha crew me faz querer buscar evolução, isso me inspira, a simplicidade e vontade de vencer do nosso povo é algo inspirador. A vida como um todo tem algo que me inspira em algum momento, quando estou dentro do ônibus a caminho de algum lugar tenho vários devaneios e reflexões que norteiam o meu trabalho, quando chego em casa anoto tudo (risos).
8 – Qual é sua combinação de cores predileta ?
Não tenho uma combinação predileta, na maioria das vezes uso o que esta a disposição. Gosto do equilíbrio das cores, nada que agrida o meu olhar ou do espectador, transições de cores racionalizadas, as vezes menos é mais.
9 – Quais são seus artistas prediletos ?
Dentro do Graffiti e com o advento da internet a lista nem cabe aqui (risos), embora esteja muito imerso no realismo gosto das demais linguagens que eu ainda não domino, letras é algo que me fascina muito pela gestualidade, liberdade e força visual, os “lazarento” que faz uns vetores com uns recortes que parece obra do Illustrator (risos). Fora do Graffiti, na minha concepção Caravaggio é o King, não só pela qualidade técnica mas, pela forma de conceber seu trabalho e sua postura diante do mesmo.
10 – Quais foram as coisas boas, que a sua arte te trouxe ?
Tudo que existe de bom na minha vida atual é advento do Graffiti nessa minha ainda curta trajetória de vida, principalmente as amizades, sem meus amigos, colegas e conhecidos dentro da Cultura eu não seria nada. A Arte abriu as janelas do universo, me apresentando um mar de possibilidades, me trouxe novos motivos e motivações pra viver, estimulou a me enxergar enquanto ser social, dotado de potencialidades e responsabilidades, fez com que eu me engajasse pelo meu bairro, cidade, país e pela vida dos que vivem uma realidade paralela que na real, só precisam de uma mão estendida. A Arte me trouxe a “utopia” da mudança, difícil, gradativa, mas é algo que me apego e quero viver defendendo a esperança por dias melhores, fazendo a minha parte, fazendo a minha Arte.
“Não à violência contra MULHER!”
11 – O que ainda não fez artisticamente e gostaria de fazer ?
Gostaria de verticalizar alguns trabalhos, pintar umas laterais de prédios espalhados pela cidade (risos), podem até pensar que é mania de grandeza, ego ou qualquer outra coisa mas, respondendo a pergunta é algo que ainda não realizei, sempre vemos nossas obras sendo apagadas pela cidades, sejam essas obras legais ou ilegais, sempre apagam, fazem propaganda, colam cartazes e etc…Quero pintar uma lateral sinistra e falar: “Ah lá carai, quero ver Fela da Puta apagar agora!” (risos)
12 – Se você não fosse artista o que você gostaria de ser ?
Sendo muito otimista, provavelmente eu seria professor de História, teria me formado e a vida me levaria a contribuir com a coletividade de outra forma. Agora pensando na possibilidade de não conhecer a História e nem a Arte, eu provavelmente não estaria vivo, todo ser humano buscar algo que te motive a abrir os olhos todos os dias e levantar, seja “Deus”, religião, dinheiro, família, esperança de uma vida confortável, um “corre do louco” implantado pela alienação. A Arte me mostrou a vida de verdade e eu estou em débito com ela e com as demais pessoas. Como diria minha mestra Lacunha (Artista há 42 anos): “Seja fiel à Arte e a Arte será fiel a você.”
13 – Deixe uma mensagem para nossos leitores.
Gostaria de agradecer toda Equipe do Arte Sem Fronteiras pela oportunidade e parabeniza-los pelo ótimo trabalho desenvolvido, dando visibilidade para vários artistas brasileiros e nos possibilitando conhecer artistas espalhados pelo mundo, agradecer geral que teve paciência de ler um pouco do que penso até aqui (risos), as vezes falo muito, a todos que admiram e incentivam a minha correria e a dos demais artistas que já passaram e irão passar por aqui. E gostaria de deixar uma reflexão (risos, vou pagar de filósofo).
“A revolução não será televisionada ? ela já não está sendo, revolução é uma coisa diária de quem busca mudanças positivas, de dentro para fora, você é a revolução, nós somos a revolução.”
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Fonte : Starley
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